Estágios, processos, metodologias e métodos de design. Em que ficamos afinal?
O Industrial Design Thinking consiste numa plataforma que reúne várias ferramentas de design thinking, explicando como estas funcionam e associando as mesmas à história do design industrial, porque é fundamental às próximas gerações de designers industriais estarem próximas da cultura do design thinking, das ferramentas de projeto inerentes, e das personagens pioneiras que caracterizaram a história do design, desmistificando assim a ideia de “novidade” em torno do design thinking. Neste espaço podes identificar o estágio e a etapa em que te encontras no teu processo de design e ter acesso a várias ferramentas de trabalho, ficando a conhecer as mesmas e podendo aplicá-las através do recurso a templates específicos.

Antes de falarmos de processo e de metodologia de design, assim como de ferramentas, é fundamental explicar o conceito de estágios de design, já que estes são na maioria das vezes ignorados do debate em torno do trabalho do designer.
Os Estágios
Estágios de design
O que são estágios de design? De forma geral o trabalho em design pode ser dividido em três estágios, que podem ou não ser interpretados de forma linear. São eles a Oportunidade, o Detalhe e a Implementação.
Decide-se por que estágio começar a trabalhar tendo por base a necessidade concreta de um cliente ou a abrangência de um projeto. Há clientes que contratam designers apenas num estágio de Oportunidade, há clientes que os contratam apenas para a Implementação, e há ainda clientes que contratam para os três estágios de projeto, de forma linear, passando o projeto pela Oportunidade, Detalhe e Implementação.
Oportunidade
O estágio Oportunidade é aquele em que o objetivo do projeto é exploratório e conceptual, de identificação de cenários para soluções futuras. Tipicamente o cliente que contrata este estágio não tem uma visão clara do que quer, e recorre ao design para que este o ajude a mapear várias soluções.
Detalhe
O estágio Detalhe tem por base refinar um conceito desenvolvido no estágio anterior, ou criar algo novo com base num briefing fechado e detalhado, onde a Oportunidade de design esteja já identificada e definida pelo cliente. Neste estágio, o cliente tipicamente já sabe o que pretende, já poderá ter uma lista de especificações, um briefing assertivo, um target e um mercado-alvo. O suporte que precisa do design é na criação de soluções que estejam alinhadas com essa necessidade, com esse briefing.
Implementação
O estágio Implementação pressupõe a definição final de produto com vista à sua industrialização. É um estágio muito mais convergente, pois tanto as especificações como o próprio design estão fechados e a necessidade prende-se com a criação dos meios que permitam a produção em massa. Neste caso o cliente pede apenas que se criem os ficheiros finais para produção, ou pode pedir uma variação no tamanho, no volume, na cor de um produto. Ou até mesmo só a criação de desenhos técnicos e manuais de funcionamento.
Fluxo entre estágios
Um designer tem de saber trabalhar em qualquer um destes estágios, de forma independente e de forma complementar. Haverá clientes que contratam o estágio Oportunidade e de seguida o estágio Detalhe, que pressupõe o detalhe de uma das oportunidades/soluções identificadas no estágio anterior. Esse mesmo cliente pode ainda contratar o estágio Implementação, caso pretenda avançar com a produção da solução que foi detalhada. Mas caso o cliente tenha um departamento técnico interno e valências em engenharia de produto, este estágio é muitas vezes feito pelo próprio cliente.
Um exemplo? Falemos do Be-Eco, uma estação de reciclagem doméstica desenvolvida pela agência de design estratégico INNGAGE para a empresa Faplana. No estágio Oportunidade foram definidos diferentes conceitos e cenários de produto, que permitiam ao cliente apontar a diferentes públicos-alvo em diferentes mercados. O cliente decidiu avançar com um dos cenários e seguimos para o estágio seguinte, o Detalhe. Neste estágio o conceito selecionado foi detalhado em pormenor, e todo o seu desenho foi refinado, tendo sido criadas várias alternativas funcionais e formais. Seguros que a proposta estava bem detalhada, decidiu-se avançar para o estágio Implementação, onde foram desenvolvidos todos os materiais necessários para a produção industrial do produto, e foi dado todo o apoio ao cliente na perspetiva de uma fácil industrialização.
O entendimento dos estágios de design é fundamental para:
– Alinhar as expectativas do cliente.
– Definir com clareza os resultados tangíveis do projeto.
– Organizar de forma correcta os processos de trabalho.
– Alocar os recursos e equipas a cada estágio.
O Processo
Mas os estágios são processo? Não, de todo. O processo é algo mais. John Page definiu o design como “um salto imaginativo de factos presentes para possibilidades futuras”. John Chris Jones definiu o design como “a iniciação da mudança nas coisas feitas pelo Homem”. Tanto o “salto imaginativo” de Page como “a mudança” de Jones, implicam um caminho. Esse caminho é o processo de design. O processo de design pressupõe um input (o briefing) e consiste numa série de eventos até se alcançar um output (a solução), que normalmente resulta numa descrição clara do que se pretende implementar.
O processo de design
Existem centenas de representações do processo de design, mas felizmente existe também alguma convergência entre tais representações. Mas antes é preciso perceber que o processo de design pode ser descritivo ou prescritivo, sendo que um processo de design descritivo é mais abstrato e apenas descreve as fases de trabalho, enquanto que um processo de design prescritivo é mais processual e prescreve as ações dentro de cada fase. Em ambos, é sempre necessário duas posturas, uma divergente e uma convergente – uma explora e coleta informação, a outra define e aponta direções. Isto é importante porque normalmente chama-se “processo de design” ao modelo descritivo e “metodologia de design” ao modelo prescritivo.
Modelo Descritivo
O processo de design descritivo mais difundido foi criado pelo Design Council, conhecido como o Double Diamond, dividindo-se portanto em quatro fases: Descoberta, Definição, Desenvolvimento e Entrega. Estas quatro fases representam as fases de desenvolvimento de produto industrial e caracterizam-se por um andamento linear, mas iterativo, por parte da equipa de projeto. Este processo descritivo é aplicado em qualquer estágio de desenvolvimento de design.
Descoberta: Como o próprio nome indica, representa uma fase de descoberta e de identificação de oportunidades. Caracteriza-se por uma fase de pesquisa, em torno das pessoas, da indústria e do mercado, dentro do segmento em que se está a trabalhar. Pretende-se a compreensão dos contextos, dos utilizadores, dos hábitos. É uma fase caracterizada por uma intensa colaboração entre a equipa de design e a equipa do cliente.
Definição: Com base na informação recolhida anteriormente, define-se com rigor aquilo que se pretende resolver e identificam-se as ilações chave que irão criar suporte a todo o desenvolvimento futuro. É expectável também que nesta fase se possam definir cenários de produto, numa perspetiva mais macro, fundamentados na pesquisa feita anteriormente e que respondam a uma problemática concreta e acertada.
Desenvolvimento: Nesta fase desenvolvem-se as soluções e procede-se ao refinamento de conceitos, ou o desdobramento dos mesmos em várias propostas. É nesta fase que se definem em concreto as soluções, as proporções, questões de ergonomia e usabilidade, definição de cores, materiais e acabamentos. Com o produto a ser definido em pormenor, esta é a fase por excelência para rapidamente tornar o conceito tangível, em forma de protótipo, e testá-lo com os utilizadores e com o cliente.
Entrega: Esta fase pressupõe o teste e finalização do produto com vista à sua produção pela indústria, motivo pelo qual está intrinsecamente relacionada com a engenharia e deve prever um trabalho colaborativo com a equipa do cliente, de forma a adaptar os requisitos do produto à realidade produtiva do cliente. Um desenvolvimento CAD rigoroso é essencial nesta fase, assim como uma prototipagem refinada para teste mecânico, de usabilidade e de assemblagem de componentes. Em alguns processos, quem produz terá sempre que realizar o seu desenvolvimento interno, mas isso não exclui a participação da equipa de design nesta etapa, assegurando que o produto que irá para produção está alinhado com aquilo que o designer concebeu e perspectivou para o produto.
Modelo Prescritivo
Os modelos prescritivos diferem dos modelos descritivos na forma como apresentam as várias fases do processo. Enquanto os modelos descritivos indicam de forma macro e abstrata as fases de um projeto, os modelos prescritivos indicam de forma micro, operacional e processual as ações a desencadear no decorrer do projeto. Em suma, os descritivos descrevem, enquanto os prescritivos prescrevem. O processo de design prescritivo mais difundido é o criado pela d.school em colaboração com a empresa norte-america IDEO. Este processo prescritivo é comumente conhecido como metodologia de design thinking. Aqui apresenta-se uma adaptação do mesmo, com a introdução de duas novas fases, Imergir e Difundir.
Imergir: É uma fase de arranque de projeto, em que a equipa de design se junta à equipa do cliente para recolha de informação e para definir os requisitos de projeto, assim como alinhar expectativas.
Explorar: A fase da pesquisa, da exploração, da descoberta. Uma etapa que se assume como divergente. Interessa abrir os horizontes e coletar o maior número de informação possível. Assente na métrica PIM, esta etapa é estruturada por pesquisa sobre as pessoas (utilizadores), indústria (meios de produção e sustentabilidade) e mercado (concorrência e modelos de negócios).
Definir: Provavelmente a fase mais importante de todo o processo e a que carece de maior detalhe. É nesta fase que se define o problema a resolver, são criadas as direções de projeto e se definem os requisitos finais para o produto. Ao contrário da fase anterior, esta é totalmente convergente.
Idear: Com a direção e requisitos de projeto definidos, esta fase pressupõe a geração de soluções. Entramos numa fase divergente, onde interessa gerar o maior número possível de soluções, a ser validadas e refinadas.
Prototipar: A prototipagem deve acompanhar todo o processo de design, mas é essencial que esta fase seja entendida como o momento certo para o confronto das soluções geradas com a realidade. É através da prototipagem que se entendem conceitos de usabilidade, de montagem, de proporção e escala, sobre os quais se podem tirar conclusões importantes para um bom desenvolvimento de produto.
Testar: Esta fase pressupõe o Teste das soluções geradas através dos protótipos desenvolvidos. É crucial que nesta fase se possa envolver os utilizadores para que o feedback seja do público-alvo em questão.
Difundir: Uma fase que se resume a criar os documentos finais de entrega ao cliente ou os suportes visuais que comuniquem a solução e que permitam a divulgação/implementação do projeto. É fundamental conseguir sistematizar a informação e torná-la legível para outros.
Modelo Descritivo vs Prescritivo
É importante reter que o modelo descritivo não anula o modelo prescritivo nem vice-versa. O modelo descritivo descreve e o prescritivo prescreve. O que podemos afirmar é que o modelo prescritivo segue os passos do modelo descritivo mas torna-o operacional, indicando ações concretas. No modelo descritivo a equipa de design sabe onde está, com o modelo prescritivo a equipa de design sabe o que fazer. Um implica o outro.
Os Modelos e os Estágios
Estes processos, modelos descritivos ou prescritivos, são usados em cada estágio de design. Usando como exemplo o modelo de processo prescritivo, se determinado projeto pressupõe apenas o estágio de Oportunidade, é expectável que se passe pelas fases de Imergir, Explorar, Definir, Idear, Prototipar, Testar e Difundir. Mas se um projeto precisar de passar por dois estágios, então o modelo de processo prescritivo é repetido em cada estágio. Ou seja, se o projeto obrigar a dois estágios como a Oportunidade e o Detalhe, as sete fases do modelo de processo prescritivo devem ser percorridas em ambos os estágios, diferindo as ferramentas aplicadas, em cada fase. O processo repete-se em cada estágio de design. As fases são as mesmas, mas as ferramentas dedicadas a cada fase alteram-se.
Vamos a um exemplo? A fase Prototipar do modelo prescritivo ajuda a entender melhor esta questão. Um protótipo no estágio Oportunidade pode ser um simples Storyboard. Um protótipo no estágio Detalhe pode ser um Modelo em Cartão. Um protótipo no estágio Implementação pode ser um Protótipo Funcional impresso em 3D. A fase é a mesma. As ferramentas são distintas mediante o estágio de design em questão.
Em suma, e em forma de fecho, qualquer designer quando aborda um projeto tem de ser capaz de identificar em que estágio de design se encontra, ou quantos estágios prevê percorrer. Com essa informação deve estruturar o seu trabalho, tendo por base a metodologia de design thinking, ou por outras palavras, o modelo prescritivo do processo de design, e conseguir identificar as ferramentas e métodos de design ao seu dispor para desenvolver um trabalho com rigor e focado no que mais importa ao design: as pessoas, a indústria e o mercado.